segunda-feira, 17 de outubro de 2016

Invasão Chinesa no setor elétrico brasileiro

Em cinco anos, gigantes chinesas tornam­-se líderes 

Por Camila Maia e Rodrigo Polito

Com pouco tempo de atuação no país, as gigantes chinesas State Grid e China Three Gorges (CTG) realizaram investimentos significativos e já se consolidaram líderes no setor elétrico brasileiro. Em termos de receita, apenas com as aquisições feitas neste ano as duas chinesas chegam em segundo lugar no setor, atrás apenas da Eletrobras, que teve faturamento de R$ 32,6 bilhões ano passado. A CTG concentra apenas ativos de geração de energia, mas a State Grid, que entrou no país como transmissora, já diversificou suas operações. Instalada no Brasil desde 2010, a State Grid já tem 7,6 mil km de linhas de transmissão em operação e 9,8 mil km em construção, quase 20% de toda a rede elétrica brasileira. O grupo é responsável pela construção dos dois linhões que escoarão energia da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu (PA), para a região Sudeste. Em 2015, o faturamento no Brasil somou R$ 1 bilhão. O país já responde por cerca de 20% das receitas da companhia fora da China. Esse percentual deve crescer consideravelmente. A State Grid caminha para concluir a aquisição da CPFL Energia, maior companhia integrada privada do setor elétrico, com 3,1 gigawatts (GW) de capacidade instalada de geração e o faturamento de 57,558 mil GWh em 2015 na área de concessão das suas oito distribuidoras de energia. A operação pode chegar a R$ 25 bilhões. A CPFL teve a terceira maior receita líquida do setor elétrico em 2015, somando R$ 20,2 bilhões, atrás da Eletrobras e da Cemig. Em junho, a CPFL comprou ainda a distribuidora AES Sul, operação que deve ser concluída em breve. A CTG também cresceu rapidamente no país. Desde 2013, quando foi oficialmente lançada no Brasil, alcançou, por meio de aquisições, uma posição de destaque no setor de geração de energia, incluindo a renovável. No ano passado, a chinesa pagou R$ 1,7 bilhão pelos ativos de energia da Triunfo. O grande salto da empresa, no entanto, aconteceu após vencer o leilão de relicitação das hidrelétricas Jupiá e Ilha Solteira, em novembro, desembolsando R$ 13,8 bilhões pelo bônus da outorga. Pelos cerca de 2 GW da Duke Energy, foi acordado um valor de US$ 1,2 bilhão, que inclui a assunção de dívidas. O montante em reais só será divulgado depois da conclusão da operação. A Duke Energy teve faturamento de R$ 1,19 bilhão em 2015 no Brasil.

Antes disso, a CTG havia investido no Brasil em parcerias com a EDP Energias do Brasil, e também pela aquisição de parques eólicos que pertenciam à EDP Renováveis. A CTG tem ainda uma participação indireta no Brasil por ser controladora da Energias de Portugal (EDP), com 21,35% das ações da companhia portuguesa. As duas gigantes chinesas também são apontadas como principais candidatas a aquisições no setor elétrico. A CTG é vista como principal candidata a comprar os ativos da Cesp em uma eventual privatização. Atualmente, a estatal paulista tem apenas as concessões das usinas Porto Primavera, com 1.540 MW de potência e vencimento em maio de 2028, Jaguari, com 27,6 MW e expira em maio de 2020, e Paraibuna, com 85 MW e vencimento em março de 2021. A State Grid, por sua vez, é apontada como potencial compradora das linhas de transmissão da Abengoa, que somam cerca de 10 mil quilômetros em operação ou em construção. Por meio da CPFL Energia, as opções de expansão das operações são ainda maiores. A companhia é uma das cinco que atualmente avaliam os ativos da Celg Distribuidora (Celg D), que será privatizada pela Eletrobras e pelo governo de Goiás ainda neste ano. Em 2017, a Eletrobras pretende colocar no mercado suas outras seis distribuidoras de energia.


CTG é a maior geradora privada do Brasil 
Por Camila Maia

Depois de meses de negociações, a China Three Gorges (CTG) anunciou ontem que chegou a um acordo para comprar os ativos de geração de energia da americana Duke Energy no Brasil, se consolidando como a maior geradora privada do país. A Duke Energy Brasil tem 2.274 megawatts (MW) de potência em operação no país. São oito hidrelétricas na fronteira entre os Estados de São Paulo e Paraná, além de duas pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), também em São Paulo. Na operação, os ativos da Duke no Brasil foram avaliados em US$ 1,2 bilhão. Esse montante, porém, inclui a assunção de dívida de cerca de R$ 1,4 bilhão. Em entrevista ao Valor, o presidente da CTG Brasil, Li Yinsheng, disse que ainda não foram definidas as condições do pagamento. Com a aquisição, a CTG, que é a maior geradora hidrelétrica do mundo, chega a um portfólio de 8,27 gigawatts (GW) no Brasil. Mesmo excluindo o percentual em construção ­ a hidrelétrica São Manoel, de 700 MW, parceria com a EDP Energias do Brasil e Furnas ­, a chinesa tem, em operação, uma capacidade instalada maior que a da Engie (antiga Tractebel), que era até então a maior empresa privada de geração do país. Segundo dados do balanço da Engie do segundo trimestre, a empresa tinha 7 GW em operação e mais 2,3 GW em construção. Na operação, o preço por ação da Duke Energy foi fixado em US$ 10,80, levando a operação a US$ 969,5 milhões. O preço final em reais será divulgado quando o negócio for fechado.

A transação ainda depende da aprovação pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Segundo Yinsheng, a conclusão deve acontecer entre dois e quatro meses. Nesse meio tempo, o foco da CTG no Brasil será na conclusão da operação, considerada "desafiadora" por envolver órgãos regulatórios no Brasil, acionistas nos Estados Unidos e na China. "Depois disso, nossa prioridade será realizar uma fusão apropriada entre a Duke e a CTG", afirmou Yinsheng. O objetivo será consolidar todos os ativos debaixo da CTG Brasil. As usinas da Duke Energy são localizadas na mesma região que Jupiá e Ilha Solteira, hidrelétricas que pertenciam à Companhia Energética de São Paulo (Cesp) e foram adquiridas pela CTG no leilão de relicitação em novembro do ano passado. A chinesa desembolsou R$ 13,8 bilhões em bônus da outorga, mas conseguiu contratos de 30 anos de duração. "Vamos ter sinergias resultantes da transação, pois as usinas estão na mesma região", disse Yinsheng. Segundo ele, porém, ainda não foram calculados os possíveis ganhos. A Duke Energy Brasil também já foi da Cesp. A companhia americana comprou os ativos em 1999, na privatização do setor elétrico realizada em São Paulo. A diferença é que as hidrelétricas da Duke Energy têm contratos significativamente mais curtos, expirando de 2029 a 2033. Esse cenário se refletiu no preço pago pela CTG, disse Yinsheng. "O cálculo do preço inclui fluxo de caixa futuro descontado, então o valor incluiu o prazo da concessão", disse o executivo. Dos 8,27 GW que a CTG tem hoje em carteira, cerca de 7,2 GW pertenceram à Cesp. Questionado sobre um possível interesse na privatização da Cesp, que hoje tem apenas concessões de três usinas, que somam 1,6 GW, Yinsheng disse não ter avaliado o ativo. A CTG mantém interesse em realizar aquisições no setor elétrico, "mas talvez em um ritmo mais lento". De acordo com o executivo, não há definições sobre novas aquisições por enquanto. A chinesa também não descarta entrar em leilões com novos projetos de geração de energia, com foco nas fontes solar e eólica, mas ainda não tem "oportunidades específicas" que possam ser divulgadas. A CTG não planeja participar do leilão de energia de reserva (LER) previsto para dezembro. As negociações entre a CTG e a Duke Energy tiveram início em março deste ano. Em fevereiro, a companhia americana anunciou que pretendia se desfazer das operações na América do Sul e na América Central. Ontem à noite, a Duke Energy anunciou ainda a venda do restante de seus ativos na região, concluindo as operações. A gestora americana I Squared Capital fechou um acordo para ficar com as operações localizadas no Peru, Chile, Equador, Guatemala, El Salvador e Argentina, por US$ 1,2 bilhão ­ montante que também inclui assunção de dívida. Os ativos, que incluem hidrelétricas e termelétricas a gás natural, somam 2,3 GW de potência. Segundo a Duke Energy, os recursos líquidos das duas operações serão utilizados para redução do endividamento da holding. Em nota, a presidente da Duke Energy, Lynn Good, afirmou que a saída da América Latina vai permitir que a companhia se concentre nas atividades nos Estados Unidos. "É também uma vitória para a I Squared Capital e para a China Three Gorges, que estão comprando ativos de qualidade", disse. (Colaboraram Juliana Machado e Paula Selmi).


State Grid vai criar nova distribuidora no Brasil
Por Rodrigo Polito 

A gigante elétrica chinesa State Grid planeja criar uma nova empresa no Brasil para gerenciar os ativos de distribuição, quando concluir a aquisição das participações no grupo CPFL Energia, uma operação que pode chegar a R$ 25 bilhões ­ a maior aquisição na área de distribuição desde o período de privatizações no setor, na década de 1990. A nova empresa poderá englobar eventualmente ativos como a Celg Distribuição (Celg D) e outras distribuidoras da Eletrobras, caso a chinesa seja bem sucedida na aquisição dessas companhias. "Não sabemos como irá acontecer. Estamos construindo uma nova empresa que cuidará do negócio de distribuição", disse Cai Hongxian, presidente da State Grid Brazil Holding (SGBH), em entrevista ao Valor. Segundo ele, a nova empresa será como uma "irmã" da SGBH e será subordinada à sede do grupo, em Pequim. O executivo não soube indicar uma data prevista para a conclusão da aquisição da CPFL. Com a decisão da Previ e do Energia São Paulo Fundo de Investimento em Ações (Energia SP) de vender suas participações na elétrica, a State Grid concluiu a compra do bloco de controle, ficando com 53,3% da empresa, por R$ 13,5 bilhões. O próximo passo será a realização de oferta pública de ações aos minoritários, que pode ficar para 2017. Cai lembrou que a aquisição da participação de 23,6% da Camargo Corrêa na CPFL, que marcou a entrada da chinesa na companhia elétrica, já foi aprovada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). O acordo, porém, aguarda pelo menos outras duas aprovações, sendo uma da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e outra do governo brasileiro, já que a CPFL, que terá agora um controlador estrangeiro, possui área de concessão na fronteira do Rio Grande do Sul com outros países (Argentina e Uruguai).

Segundo o executivo, o grupo chinês elegeu o Brasil como o seu principal alvo de investimentos fora da China. A companhia, que vai investir R$ 15 bilhões nos próximos três anos em projetos já contratados no Brasil, avalia novas aquisições no país e desenvolver projetos do zero, a partir de leilões de linhas de transmissão. Nesse sentido, a elétrica estuda participar do próximo leilão marcado para o fim deste mês. "Estamos em vários lugares do mundo, mas o Brasil é o principal país para investimentos da State Grid fora da China hoje. Minha sede está prestando muita atenção na nova estratégia, em como desenvolver nossos negócios no Brasil", afirmou Cai. Com R$ 1 bilhão de faturamento anual (conforme dados referentes a 2015. No primeiro semestre deste ano, a cifra foi de R$ 708 milhões), o Brasil já responde por quase 20% das receitas da State Grid fora da China. O grupo, responsável pela construção dos dois linhões que escoarão energia da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu (PA), para a região Sudeste, com cerca de 4,6 mil km de extensão, prevê investir R$ 5 bilhões em 2017. Desse total, R$ 2,8 bilhões serão com capital próprio e R$ 2,2 bilhões em financiamentos. Cai, que participou na última semana de reunião no Banco de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) sobre o leilão Celg D, explicou que todas as operações de aquisição no Brasil são conduzidas e decididas por uma equipe especial na sede do grupo, em Pequim. O braço brasileiro apenas auxilia fornecendo informações para a holding. Além da Celg D, que deve ir à leilão em novembro, os principais novos negócios no radar da chinesa são a privatização das outras seis distribuidoras da Eletrobras, em 2017, e ativos de transmissão da espanhola Abengoa. Questionado sobre este assunto, Cai reforçou que todo negócio de aquisição é tratado por Pequim, mas pontuou que o caso da Abengoa ainda depende de aprovação de assembleia de credores da empresa, que está em recuperação judicial no Brasil. A State Grid espera obter em janeiro de 2017 a licença de instalação para iniciar a construção das subestações conversoras do segundo sistema de transmissão de Belo Monte, que ligará a usina até Nova Iguaçu (RJ), com 2,5 mil km de extensão. A companhia submeteu os estudos de impacto ambiental (EIA­Rima) ao Ibama em março deste ano e está realizando as últimas audiências públicas necessárias para discutir o projeto. A expectativa, segundo Cai Hongxian, é obter a licença de instalação para a implantação da linha de transmissão em março do próximo ano. A data é considerada fundamental pela companhia, para aproveitar a janela de oportunidade do período seco ­ entre abril e novembro. O segundo linhão de Belo Monte tem investimentos previstos de R$ 7 bilhões, de acordo com a Aneel. O executivo, porém, lembra que é preciso acrescentar a esse valor outros 25% relativos a inflação e custos de financiamento, entre outros itens. A linha está prevista para entrar em operação em dezembro de 2019. O primeiro linhão de Belo Monte, do qual a State Grid possui 51% de participação, em parceira com Furnas (49%), está com as obras em andamento. Com R$ 5 bilhões de investimentos estimados pela Aneel e 2,1 mil km, a linha está prevista para iniciar operação em fevereiro de 2018. Instalada no país desde 2010, a State Grid tem 7,6 mil km de linhas de transmissão em operação e 9,8 mil km em construção, quase 20% de toda a rede elétrica brasileira.

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