A reforma trabalhista está na agenda do Congresso
Nacional a partir de proposta encaminhada, em dezembro de 2017, pelo governo do
presidente Michel Temer. Este projeto de Lei, apesar de tratar de um número
bastante limitado de questões, já trazia, na primeira formulação, polêmicas que
exigiam, para uma boa solução acordada, grande debate e cuidadoso processo
negocial e legislativo. Nessa
primeira quinzena de abril, o relator da Comissão Especial que trata do assunto, deputado
Rogério Marinho, apresentou um relatório que altera substantivamente o projeto
encaminhado pelo Executivo. A formiga transformou-se em elefante.
O
novo texto do Projeto, agora apresentado pelo relator, mexe na organização e no financiamento sindical, altera o
processo de negociação, confere novos poderes aos instrumentos que celebram os
acordos, cria outras atribuições para a justiça do trabalho, dá força de quitação a novos atores, reconfigura inúmeros
direitos trabalhistas e procura oferecer garantias a inúmeras práticas
empresariais que são combatidas pelo movimento sindical e rejeitadas pelos
trabalhadores.
O
projeto busca fazer uma limpeza legislativa, submetendo todo aparato
institucional e legal ao mercado,
garantindo às empresas condições para se adequar à competição e concorrência e
à busca da rentabilidade espúria por meio de práticas de superexploração do
trabalho.
A abordagem permite criar um ambiente
institucional favorável a uma redução estrutural do custo do trabalho e
permanente flexibilização para cenários futuros. A legislação autorizará a
redução e os sindicatos terão a coluna de proteção fragilizada.
É a desregulação do trabalho, com a oferta de amparo
legal a inúmeras práticas empresariais que hoje são proibidas na lei, impedidas
pela interpretação da justiça ou dificultadas pela ação sindical.
Para enfrentar os conflitos existentes nas
relações sociais de produção e na distribuição do resultado, as sociedades
democráticas criaram sistemas de relações de trabalho para normatizar as relações de produção. Os sindicatos se firmaram como sujeitos de
representação coletiva e agentes históricos voltados para tratar dos conflitos
existentes na produção e distribuição da riqueza.
As condições de trabalho, os contratos, os salários e os direitos passaram a
ser regulados por acordos diretos entre as partes ou por uma legislação geral e
específica. A combinação desses elementos constituiu os complexos e diferentes
sistemas de relações de trabalho.
Em
funcionamento há mais de sete
décadas, baseado na Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, o sistema de
relações de trabalho brasileiro já passou por diversas atualizações. Em alguns
momentos, negociações foram interrompidas e desvalorizadas, em outros,
retomadas e fortalecidas; conflitos foram resolvidos provisoriamente e, às
vezes, de maneira precária. O sistema sindical brasileiro consegue proteger boa
parte da força de trabalho, mas grande contingente permanece sem proteção. Há ainda muito para ser alterado para proteger a
todos no no mundo do trabalho.
Qualquer
mudança, no entanto, deve ser antecedida de amplo debate entre trabalhadores e empregadores, com participação
dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. A construção de qualquer
proposta tem que ser feita em espaço de negociação, com o desenho completo de
todos os elementos do sistema de relações de trabalho, a fim de configurar um
projeto que enfrente e supere os problemas identificados. As novas regras
seriam a base para orientar um novo padrão de relações laborais.
É preciso que
fique bem claro que o entendimento é um
requerimento essencial e condição necessária para o sucesso das mudanças. Isso
somente será possível se o
processo de mudança for resultado de efetivo espaço de negociação, no qual a mediação social promovida pelo
diálogo se oriente pelo projeto de desenvolvimento nacional que se quer
perseguir.
O desenho das
mudanças exige muitos exercícios que simulem resultados esperados, assim como
esboços diversos de transição. Esse tipo de negociação e pactuação exige tempo,
método, continuidade, assiduidade, compromisso, disponibilidade para pensar o
novo, segurança para arriscar e vontade compartilhada para acertar. Demanda,
fundamentalmente, desenvolver confiança no espaço de conflito, envolvimento de trabalhadores,
empregadores e do Legislativo, Executivo e Judiciário.
A
complementariedade entre a legislação e os acordos coletivos deve ser buscada por
sindicatos fortes e representativos, capazes de firmar contratos em todos os
níveis e de dar solução ágil aos conflitos, apoiados por um Estado que promova
e proteja a força produtiva (empresa e trabalhadores) e melhore a distribuição
dos resultados por meio do direito social e das políticas públicas. Nesse
sentido, existe um campo de possibilidades para a construção de projetos de
reforma, muito diferente daquilo que se apresenta hoje na agenda do debate
público no Brasil.
No jogo social,
as derrotas impostas no campo da regulação ampliam os conflitos, aumentam a
insegurança e travam as relações. Na produção, reduzem a produtividade. No
desenvolvimento do país, traz retrocessos.
É urgente mudar
o rumo desse processo legislativo, a fim de evitar riscos de aumento de
conflitos que travarão ainda mais o desenvolvimento do país.
Clemente Ganz Lúcio - DIEESE
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